Desabafo de um policial sobre a crise na PF »
Pessoal, é o seguinte: eu vou falar por mim. É o sentimento que me acomete nesse momento. Eu estou há quase 11 anos no Departamento de Polícia Federal. Tenho muito mais tempo na casa do que a grande parte, aí eu vou me dirigir a duas categorias, não tem jeito.
Eu acho que em relação a 80% dos delegados e peritos dessa casa eu tenho mais tempo na casa. Já vivi coisas que a grande maioria deles não viveu e não vai viver. Eu posso dizer para os senhores que o sentimento que acomete este pai de família, este servidor da Polícia Federal, que está há 11 anos na casa, com mais de 800 horas em cursos dentro dessa casa e fora, é de crise, realmente, senhor superintendente. É de muita crise.
Eu posso dizer o seguinte: este sentimento é reverberado, e aí eu vou usar palavras um pouco mais ríspidas, pela política separatista, beirando o “apartheid”, que a associação dos delegados da Polícia Federal defende contra o nosso movimento.
Os senhores fazem parte dela, como todos os outros delegados aqui fazem parte, não é? Isso ficou claro, foi dito pelo senhor ministro da Justiça, numa reunião com a FENAPEF: “Os senhores não são a PRF (Polícia Rodoviária Federal). Se fossem, já teriam ganhado a sua reestruturação”. Isso foi manifestado em todas as redes sociais e saiu na imprensa.
Essa política contribui para um fenômeno que eu nunca tinha visto dentro do Departamento de Polícia Federal. A Polícia Federal passa por uma crise institucional e de imagem perante a população brasileira e perante a Presidência da República. O senhor delegado de Polícia Federal que ocupa a secretaria de segurança da Copa acabou de perder quase 60 ou 70% dos poderes para os militares. Isso aconteceu. É a primeira crise.
A segunda é a crise ausência de recursos. Eu nunca vi isso dentro do Departamento. Essa política de uma associação, que não é uma névoa, ela é composta por servidores da casa, de uma categoria. Já vi vários delegados de polícia dizendo: “eu apóio o pleito de vocês”. Então, faça por escrito. “Ah, eu não posso!”. Então o senhor está assumindo o posicionamento da sua associação. É o que pra mim passa.
Essa política é reverberada pela omissão dos peritos criminais federais desta casa, que em momento nenhum, a APCF (Associação dos Peritos Criminais Federais), em momento nenhum, declarou apoio ou se declarou contrário ao movimento. Eles têm que tomar uma posição. Que é muito fácil, senhor superintendente, senhor corregedor, senhor DRCOR, bater nas nossas costas e dizer que apóia nosso pleito.
Só que essa política está tirando a opção de vida do meu filho de estudar na mesma escola que o filho do senhor superintendente poderá estudar, do senhor corregedor regional e o do senhor DRCOR. Tira a possibilidade de meu filho à mesma qualidade de lazer, de educação, de plano de saúde, de alimentação, de vida e moradia. Enquanto arrisco minha vida, tanto quanto, ou mais, do que a grande parte dos integrantes dessas carreiras.
Então, não tem como colocar de outra forma: é crise. Nada será como antes, senhor superintendente, senhor corregedor, senhor DRCOR. Não dá mais para entrar, passar por aquele portão e achar que tudo será como foi antes. Não vai ser, certo? Eu não me sinto à vontade. Eu tenho posicionamentos extremamente radicais, por isso eu não estou no comando de greve. Preferi não entrar no comando de greve. Alguns colegas disseram: “não você tem que ir”. Eu não tenho condições nenhuma de me relacionar - a não ser profissionalmente - no limite da educação que meus pais me deram, com essas duas categorias.
Estou dizendo isso de peito aberto. Não entendam como uma ameaça ou o que os senhores disseram. Entendam como uma atitude muito boa, eu sei disso, contra os problemas que hajam de urbanidade. É preciso que eles saibam. É uma pena que eles não estejam aqui. Deveriam estar aqui - delegados e peritos - que eu diria isso para eles ouvirem: que a omissão dos peritos criminais e a política separatista, de segregação, beirando o apartheid, que a ADPF reverbera pelo Brasil está acabando com a nossa profissão, com a nossa casa. Essa casa vai acabar.
Nós vamos perder as atribuições, vamos perder os recursos e estamos perdendo hoje com esse movimento o que tem de melhor nessa casa, que somos nós. Todo mundo aqui só vai dar o mínimo possível. É isso que vai ficar desse movimento. Nós vamos perder o maior patrimônio que a Polícia Federal tem: nós POLICIAIS FEDERAIS.
O desestímulo é grande. O desestímulo é muito grande e é isso que vai ficar. Essa herança que vai ficar. Porque que quem está, o senhor sabe muito bem, já está na casa há quase 10 anos, que quem faz a linha avançada da Polícia Federal são os EPAS. Não são delegados, nem peritos. E essa linha avançada vai acabar, se a reestruturação não sair.
Posso dizer para os senhores que eu, Mário, agente de Polícia Federal, há quase 11 anos na casa, farei estritamente o que está na lei. Se não sou responsável, se não me cabe gerenciar, planejar, coordenar, eu não farei mais essas atividades. Alguém vai ter que assumir esse ônus, já que nós não temos bônus nenhum nesta casa. Esta casa não é comandada para nós. Pelo contrário: é contra nós. Esse é o sentimento que me acomete.
Me desculpe se eu fui ofensivo a alguém, mas essa é minha opinião pessoal.
(*) Depoimento do agente de Polícia Federal, Mário Augusto Filho, durante reunião de agentes, escrivães e papiloscopistas, com o superintendente regional, o corregedor regional e delegado regional de Combate ao Crime Organizado, do Departamento de Polícia Federal na Bahia, no último dia 26 de setembro.
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