Greve por mais eficiência no setor público »
Ao sair do país recentemente, recebi um folheto das mãos de uma funcionária pública no aeroporto, logo antes dos guichês de verificação do passaporte feita pela Polícia Federal.
Peguei o folheto, como muitos o fazem, apenas para ser gentil com a pessoa que o estava distribuindo. Porém, como as filas nos aeroportos são sempre muito longas e demoradas, acabei tendo tempo suficiente para olhar com calma aquele folheto.
Intitulado simplesmente “Reivindicações”, continha as cinco principais reivindicações dos funcionários em greve da Polícia Federal. No verso, havia uma análise da situação atual da Polícia Federal e da segurança em geral, com o sugestivo titulo “O governo brinca com a segurança dos grandes eventos”, fazendo referência aos eventos internacionais Copa do Mundo e Olimpíadas, previstos para os próximos anos, como sabemos.
O que chamou muito a minha atenção foi o conteúdo de algumas reivindicações e da natureza da análise realizada. Acostumado a greves que pedem mais recursos, como salários, benefícios etc., para seus funcionários, o movimento da Polícia Federal focaliza muito nos processos de trabalho, nas formas de funcionamento, em suas políticas de investimento, suas prioridades e missão, entre outras.
Uma das reivindicações é "a reestruturação de processos de trabalho ineficientes, a exemplo da maior parte das investigações, com o aproveitamento pleno das competências dentro do órgão, quebrando a centralização burocrática”. Ou seja, o movimento grevista demanda um melhor aproveitamento da capacidade das pessoas do órgão em realizar o trabalho de uma maneira melhor do que está sendo feito atualmente.
E outra demanda trata da "criação de um modelo de auditoria por parte do governo, preferencialmente o Ministério do Orçamento e Gestão, de modo a verificar os resultados práticos dos inquéritos policiais em curso, em que a medida de produtividade deverá ser dada por caso elucidado e não por caso ‘relatado‘”.
Fascinante notar que essa reivindicação questiona a produtividade e um de seus indicadores existente que poderia mascarar a realidade e ainda sugere critérios mais eficazes. Sabemos que os indicadores devem focalizar nos principais fatores de desempenho e devem mostrar a realidade dos fatos com o intuito de sabermos onde estamos, as metas e definir os planos de como atingi-las. Trata-se de técnica e preocupação bastante comum na maior parte das empresas privadas, mas quase sempre ausente nas empresas públicas.
E mais, uma outra reivindicação requer "auditoria por parte do governo nos investimentos logísticos e tecnológicos da instituição, objetivando identificar o efetivo emprego do que foi adquirido, bem como sua real utilidade nas atividades públicas". Outra grande surpresa! Muito salutar a preocupação em não alocar os recursos em ativos desnecessários e não prioritários. Reconhecer a má utilização dos recursos e desperdícios nos investimentos desnecessários não acontece com frequência nem mesmo nas melhores empresas privadas.
O documento aponta a existência de métodos de trabalho antiquados e investimentos equivocados que iriam alocar recursos significativos, da ordem de milhões de reais, em atividades não prioritárias, segundo a sua ótica.
Os verdadeiros propósitos da instituição, de defender o país das ações de criminosos não seriam atingidos devido a existência de processos ineficazes e da má definição das prioridades dos investimentos, sugerem os grevistas.
Não tenho conhecimento e informações suficientes sobre o que se passa no interior da Polícia Federal para julgar sobre a procedência desses argumentos. Mas isso não é o que importa nesse momento.
O documento assinado pelo comando de greve de Minas Gerais pode entrar para história com um registro dos primeiros movimentos trabalhistas por maior eficiência no setor público feito pelos próprios colaboradores que se tem notícia.
É sempre difícil lidar com greves em setores estratégicos e essenciais, como é o caso da Polícia Federal. Mas normalmente, e é compreensível que assim o seja, as greves procuram defender os interesses corporativos de seus funcionários, sem necessariamente se preocupar diretamente com os propósitos das organizações e com a eficiência de seus métodos de trabalho.
Vamos tentar acompanhar o desfecho dessa greve, perdida entre tantos assuntos que atraem a opinião pública, como as várias outras greves no setor público e nas empresas privadas, o julgamento do mensalão, as eleições municipais, a CPI do Cachoeira (meio esquecida no momento) etc., para ver como reage o governo cuja obrigação deveria ser melhorar a eficiência desse setor.
Temos visto muitas greves lutando contra o aumento da eficiência das empresas do setor privado pelos movimentos sindicais acreditarem, muitas vezes, que isso significaria uma maior intensificação do trabalho e piora em suas condições.
Mas o fato de termos uma greve do setor público reivindicando maior eficiência é um fato extraordinário.
José Roberto Ferro escreve às segundas-feiras
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