Reforma da Previdência: uma luta desigual
Antonio Augusto de Queiroz*
O melhor diagnóstico e prognóstico sobre a correlação de forças no embate da Reforma da Previdência foi do consultor e cientista político Murillo de Aragão. Na edição de maio da publicação "Cenários Políticos" de sua empresa de Consultoria Arko Advice, Murillo mapeou os agentes políticos envolvidos e seus recursos de poder, identificando seis a favor da reforma e apenas dois contra.
Entre os aliados do Governo, ele citou o próprio presidente Lula e o ministro chefe da Casa Civil, os governadores e prefeitos, o mercado, a mídia e a base de sustentação no Congresso. Já na oposição, questionando pontos específicos, estariam os servidores públicos, por intermédio de suas entidades de classe, incluindo a CUT, e os partidos de oposição, particularmente o PFL e PSDB. Os chamados radicais do PT, na opinião do analista, não constituíam ameaça, porque suas divergências seriam apenas no plano retórico.
Após elogiar a metodologia adotada pelo governo, desde o cuidado para eleger os presidentes das Casas do Congresso e formar uma grande coalizão de sustentação no Legislativo, passando pela criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, até a parceria com os governadores, o analista lista os recursos de poder de cada agente político e conclui afirmando que as chances de aprovação são enormes, admitindo algumas concessões e uma divergência da base aliada não muito superior a dez por cento.
Agentes e recursos de poder dos aliados
"Lula - O primeiro e principal ator desse processo. Seus recursos de poder são enormes, cabendo mencionar: i) elevada popularidade; ii) alta credibilidade perante os setores sociais, que o consideram incapaz de patrocinar qualquer medida injusta; iii) boa legitimidade até pelo fato de as mudanças terem constado de seu programa de governo; iv) sua liderança sobre o Partido dos Trabalhadores, inclusive sobre a ala radical; e v) o acesso fácil e o apoio dos meios de comunicação.
José Dirceu - Segundo homem na hierarquia do governo, possui os seguintes recursos de poder: a) cuida das nomeações no Governo; b) controla a liberação de recursos (emendas) do orçamento; c) coordena a ação dos ministros; d) negocia politicamente a liberação de recursos para os estados e municípios; e) exerce forte influência sobre o PT, partido do qual foi presidente.
Governadores - Tão importantes quanto o Governo Federal nesse processo, podem ter papel decisivo porque: i) têm ascendência e forte influência sobre suas bancadas no Congresso; ii) podem acionar os prefeitos para que pressionem o voto de parlamentares; iii) controlam as verbas estaduais de interesse das bases dos deputados; iv) nomeiam e demitem os correligionários dos parlamentares; e v) podem eleger ou bloquear a eleição de deputados.
Mídia - É seguramente a maior aliada do governo nesse processo: i) é vista, ouvida ou lida pela maioria do povo brasileiro; ii) goza de grande credibilidade; iii) tem a capacidade de filtrar as opiniões contrárias; e iv) forma opinião.
Mercado - Os investidores têm muito interesse nas reformas e colocarão seu poder de pressão em favor da aprovação. Ajudam a firmar posição sobre a importância das reformas para a estabilidade econômica do país, para a queda do risco-país e para atrair mais investimentos produtivos para o Brasil.
Partidos aliados - Serão os principais responsáveis pela condução das reformas. Poderão: a) evitar manobras da oposição; b) evitar discussões desgastantes sobre o mérito das matérias; c) colaborar para que o numero de Destaques Para Votação em Separado - DVS a serem apresentados seja menor; e d) dar quorum e voto nas sessões de votação.
Agentes de recursos de poder dos adversários
Servidores e suas entidades - Poderão utilizar os seguintes recursos: a) manifestações públicas; b) pressão sobre os parlamentares; c) campanhas publicitárias contra pontos da reforma; d) jornais, boletins e panfletos contra a reforma; e e) organização de marchas e caravanas de protesto à Brasília, entre outros.
Oposição - Poderá ser a responsável por uma eventual derrota parcial do Governo. Dispõe de: tribuna para falar; acesso aos meios de comunicação e inúmeros recursos regimentais para atrapalhar o processo de votação, como destaques, requerimentos, questões de ordem etc."
De fato, o analista tem razão: os recursos de poder do governo são grandes e seguramente serão decisivos para a provável vitória governamental. Entretanto, mesmo com todos esses recursos, o controle sobre esse processo já esteve ameaçado. Não fosse a atuação do presidente da Câmara, deputado João Paulo - que, percebendo o risco de descontrole, mediou negociação que pacificou os três poderes - o País estaria passando por uma grave crise institucional.
Apesar da sábia e oportuna intervenção do presidente da Câmara, o risco de derrota pontual do governo ainda não foi de todo afastado, dependendo, de um lado, das concessões que poderá fazer numa eventual emenda aglutinativa e, de outro, da mobilização e capacidade de pressão dos servidores. A sorte está lançada.
*Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e Diretor de Documentação do DIAP - artigo publicado em 31/07/2003, no site do DIAP - www.diap.org.br
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