O governo e a encruzilhada policial »
O governo federal, em especial o ministro da Justiça, está diante de uma encruzilhada. De um lado, um grupo de delegados da Polícia Federal apoia teses como a carreira jurídica para a classe (modelo sem nenhum respaldo no mundo civilizado), a PEC 37 (conhecida popularmente como a "PEC da Impunidade"), a valorização do inquérito policial (o qual, segundo o sociólogo Michel Misse, é uma solução mista e ambivalente na persecução criminal, adotada somente no Brasil) e a manutenção de uma estrutura interna hierarquizada e burocrática.
De outro lado, milhares de policiais federais defendem o oposto: em vez de carreira jurídica, a Polícia Federal deveria se espelhar nas melhores práticas policiais existentes no mundo e iniciar, o quanto antes, um processo de melhoria contínua nos seus processos gerenciais e operacionais. Em vez de tentar limitar a atuação do Ministério Público, a PF deveria criar com essa instituição um ambiente de cooperação e integração, a fim de melhor combater o crime e as organizações criminosas, que se tornam cada vez mais perigosas e entranhadas no corpo do Estado. Em vez do inquérito policial, a PF deveria estar defendendo a introdução de um novo procedimento investigatório criminal, capaz de agilizar o trabalho da polícia e contribuir no sentido do aperfeiçoamento da persecução criminal no Brasil.
Por fim, em vez de se agarrar a uma estrutura ultrapassada, a PF deveria buscar o conhecimento de organizações policiais reconhecidas mundialmente, como o FBI e a Scotland Yard, por exemplo, onde há processos de seleção e desenvolvimento de recursos humanos que privilegiam a competência, o mérito e a eficiência. E chega a ser difícil (motivo de risos até) explicar aos policiais dessas organizações a existência de uma “classe dirigente”, definida apenas pelo porte de diploma de nível superior, em curso de direito. Afinal, para eles, a polícia moderna tem como princípios o trabalho em equipe, o conhecimento oriundo de diferentes formações acadêmicas e a promoção baseada no mérito e na competência.
Destaca-se ainda que o art. 144 § 1º da Constituição de 1988 define a Polícia Federal como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira. Já a Lei 9.266/96, que reorganizou as classes da carreira policial federal, em seu art. 2º, prevê que o ingresso nos cargos da instituição far-se-á mediante concurso público, exigido o curso superior completo, em nível de graduação, sem definir qualquer privilégio a curso específico. Assim sendo, o governo e o ministro da Justiça têm agora a oportunidade de escolher o tipo de Polícia Federal que irá responder aos imensos desafios da sociedade brasileira no século XXI. Nessa encruzilhada há uma seta indicando o futuro, e outra o passado. Caberá aos dirigentes escolher o caminho a seguir.
Carlos Alberto de Mello é agente de polícia federal, formado em comunicação social e pós-graduado em letras.
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